Joana Fojo Ferreira A pandemia do covid-19 implicou ajustes e adaptações nas vidas de todos nós. Há os que tiveram relativa facilidade neste ajuste, e até fizeram reformulações interessantes e desejadas nas suas vidas, e há os que tiveram mais dificuldade, para quem a situação foi mais desafiante e dura.
Passados dois meses, há potencialmente novas mudanças, novas adaptações, que o cenário atual, ainda que gradualmente, impõe fazer – os que gostaram ou beneficiaram da experiência de confinamento, podem ter dificuldade agora no retorno ao registo anterior, e os que tiveram dificuldade com o confinamento, podem debater-se com a lentidão necessária do retorno. Independentemente de para que lado pendemos mais, darmo-nos tempo e espaço para ir fazendo o balanço desta experiência é importante para a integrarmos na nossa história, na nossa identidade, de uma forma o mais tranquila e saudável possível:
Enfim, há muito para refletir e integrar, e associado a um contexto de incerteza do que vai acontecer daqui para a frente – o retorno é definitivo ou vamos precisar voltar ao confinamento? Quando é que nos poderemos sentir mais seguros relativamente aos riscos de contágio? Quanto é que as dificuldades económicas decorrentes da pandemia me vão afetar? Quando é que me posso voltar a sentir um cidadão do mundo e desfrutar de uma mobilidade relativamente livre por ele?… É tempo de nos darmos espaço para ir formulando as nossas perguntas e encontrando as nossas respostas. Salvo situações mais radicais de fundamentalismos preocupantes, não há reações certas e erradas, nem opiniões certas e erradas, vamo-nos debruçando sobre elas à medida que as vamos sentindo presentes em nós, e vamo-nos construindo ou reconstruindo com elas.
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Andreia Silva Santos “Esta insatisfacão não consigo compreender Sempre esta sensação Que estou a perder Tenho pressa de sair Quero sentir ao chegar Vontade de partir P'ra outro lugar Vou continuar a procurar O meu mundo O meu lugar Porque até aqui eu só: Estou bem aonde eu não estou Porque eu só quero ir Aonde eu não vou Porque eu só estou bem Aonde eu não estou” (...) “Estou Além” de António Variações, uma descrição simples e tão precisa daquela sensação que chega a ser angustiante, pois por mais que se faça ou que façam por nós, nada chega. Tal como ele diz: “Não consigo dominar Este estado de ansiedade A pressa de chegar P'ra não chegar tarde não sei de que é que eu fujo Será desta solidão Mas porque é que eu recuso Quem quer dar-me a mão” Costumo dizer que a insatisfação, é como um consumidor de energia, precisamente porque ao sentir insatisfação (interna) tendemos a procurar alimento (fora/externo) e na realidade, quanto mais se procura menos saciados ou satisfeitos ficamos, e consequentemente mais ansiosos e angustiados, porque já tentamos tudo o que estava fora e nada resultou! Na realidade esta sensação que é tão visceral porque sinaliza algum tipo de necessidade psicológica. Ao contrário do que é o senso comum ou o nosso primeiro instinto, a solução está dentro, está na aceitação e não resignação, do nosso estado. Quantas vezes não ouvimos dizer ou dizemos para nós próprios: eu vou ser feliz quando…, eu queria era ter um namorado(a) que fosse assim (quando na realidade já têm), as pessoas que estão constantemente a mudar as coisas em casa de lugar, ou de sítios para viver (sem necessidade), quando nunca mais se consegue acabar um trabalho, porque ainda não está suficientemente bom... Mas atenção! Precisamos da insatisfação para evoluirmos, desafiarmo-nos, crescermos. A questão está em encontrar um equilíbrio (sei que por vezes difícil) entre, um continuar a procurar, melhorar e explorar e uma tranquilidade em que possamos dizer a nós próprios está tudo bem (mesmo que o trabalho não esteja exactamente como nós desejaríamos, mesmo quando estamos a sentir que o dia não está a correr tão bem, mesmo quando se queria algo mas naquele exacto momento não é possível). ![]() Joana Fojo Ferreira Há uns tempos, no seguimento de ter escrito o texto Sobre a ansiedade, pediram-me para escrever mais especificamente sobre o medo de falar em público, que é uma forma de ansiedade social.
O que é a ansiedade social? A ansiedade social é um padrão persistente de desconforto e nervosismo acentuado em contextos sociais; podem ser contextos de interacção, ou contextos de desempenho, como o caso de falar em público. A emoção comumente associada à ansiedade social é a vergonha, o medo de ser ridículo ou desadequado, e de ser julgado e criticado pelos outros. A pessoa com ansiedade social tende a ter uma imagem de si como socialmente desadequada ou sem valor, como uma fraude que não merece a atenção ou o reconhecimento dos outros. De onde vem e como é que é mantida a ansiedade social? Esta sensibilidade extrema à crítica e a ser visto como desadequado ou impostor, advém tipicamente de na infância ter recebido mensagens críticas de estar a ser vergonhoso ou não estar a ser suficientemente bom; mensagens estas que podem ter sido mais explícitas ou mais implícitas. A pessoa cria portanto um modelo de si como alguém defeituoso ou inferior e esta imagem prolonga-se pela sua vida e é frequentemente reforçada pela própria pessoa sem que ela se aperceba disso. O que geralmente acontece é que, para lidar com esta ansiedade, desenvolve estratégias que aliviam a curto-prazo, mas que alimentam a imagem negativa de si a médio-longo prazo. Por exemplo, a pessoa tende a preocupar-se excessivamente com o seu desempenho, no sentido de evitar falhas que possam ser julgadas pelos outros, e neste processo perde o contacto com a sua experiência no momento e o conteúdo do que quer apresentar, no caso de uma comunicação em público, e passa a observar-se de fora, a focar-se na imagem que estará a passar aos outros. Isto naturalmente desconcentra-a da tarefa em si e pode inclusivamente prejudicá-la, reforçando a ideia de que se é incompetente ou inferior. Outro exemplo é o processo de evitamento: face ao medo de falar em público, evita fazê-lo, mas ao evitá-lo perde a possibilidade de desconfirmar a sua crença negativa de si e reforça a ideia de que não é suficientemente competente. Ainda um outro, a pessoa com ansiedade social tende a tentar passar a melhor imagem possível de si, com a ideia de que qualquer falha, por pequena que seja, vai ser alvo de crítica e humilhação; mas ao não expor os seus lados mais frágeis e vulneráveis fica sempre com a sensação de estar a ser uma fraude, e à custa disso tem dificuldade em acreditar e integrar o feedback positivo dos outros, sentindo que eles só têm uma boa imagem de si porque não a conhecem verdadeiramente. Como é que se quebra o ciclo de ansiedade social? Sucintamente há dois focos, há o foco dos comportamentos que contribuem para manter a ansiedade social, e há o foco das experiências precoces, na infância, que contribuíram para esta vergonha excessiva e esta imagem de si como defeituoso e inferior. Para o primeiro foco, é preciso desafiar estes comportamentos: refocar na tarefa em vez de se estar a focar exageradamente em si, combater o evitamento e expor-se de facto às situações temidas, e aprender a vulnerabilizar-se perante os outros, percebendo que todos temos defeitos e não nos tornamos obrigatoriamente alvo de crítica e ridicularização por eles. Para o segundo foco, o trabalho é muito de descobrir internamente o que o tornou tão vulnerável à crítica e à ridicularização, que experiências contribuíram para esta imagem tão negativa de si, no sentido de poder desfazer esta imagem e contribuir para um maior à vontade e maior satisfação nas interacções e desempenhos sociais. Naturalmente que este trabalho não é fácil sozinho, caso sinta que a ansiedade social prejudica seriamente a sua vida pessoal ou profissional e a sua satisfação com os seus relacionamentos e interacções, invista num trabalho psicológico que o possa ajudar a recuperar ou a descobrir uma forma mais tranquila e satisfatória de estar consigo próprio e com os outros. |
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